Por Germano Assad
Trabalhadores que dependem da voz precisam de cuidados permanentes para preservar seu principal instrumento de trabalho. O fonoaudiólogo é o especialista que dá o suporte para que estes profissionais aprendam a respirar melhor, articular, pronunciar as palavras e projetar a voz da melhor maneira possível. Mas em muitos casos, ele só é procurado quando algum problema já está interferindo em sua rotina.
“Trabalho há 37 anos com voz. Quando chega um cantor, professor, telejornalista ou comunicador da rádio ou da TV disfônico, que perdeu a voz, ele já está desesperado, porque a profissão dele está em jogo, muitas pessoas só se tocam da necessidade dos cuidados quando o problema já está instalado”, conta o professor e vice-presidente do Conselho Federal de Fonoaudiologia, Dr. Francisco Pletsch.
Ainda que consiga reverter a maioria dos casos, nada é mais eficiente que consciência e cuidados preventivos. “Hoje temos muita coisa nova, até laser na laringe a gente utiliza para melhora das funções, eletroestimulação neuromotora, equipamentos e exercícios capazes de restabelecer a maioria dos problemas vocais”.
O Dr. Pletsch elenca ao longo da matéria, hábitos prejudiciais que precisam ser evitados a qualquer custo e cuidados básicos que vão manter a voz em dia, cada vez mais potente e com menos esforço na hora de usá-la.
Cigarro e Álcool
O inimigo número um do profissional da voz é o cigarro. Fumantes compulsivos ou que mantém o hábito por anos estão ainda mais sujeitos a danos permanentes e irreversíveis na voz.
Isto porque, toda vez que o fumante traga, a fumaça aquece sua garganta e irrita a faringe e as pregas vocais, fazendo um ressecamento e possível formação de edemas na garganta. Portanto, não existem alternativas, já que charutos, cigarros eletrônicos, narguiles e outros dispositivos prejudicam da mesma forma.
“As pessoas geralmente falam em nicotina e alcatrão. Mas o cigarro libera mais de quatro mil componentes químicos nocivos à voz e a saúde em geral. Então o profissional da voz, que ama sua voz e tem uma carreira pela frente precisa ter esse cuidado de jamais colocar um cigarro na boca”, explica o especialista.
Bebidas alcoólicas são as segundas maiores vilãs. Mas diferente do cigarro, é possível consumi-las, moderadamente, sem prejuízos à voz. “As fermentadas têm um teor bem menor de álcool e não prejudicam praticamente em nada a voz se consumidas de forma moderada. Tomar uma cerveja uma vez por semana, um vinho no final de semana, ou um cálice de vinho (100 ml) todos os dias”.
A moderação, nestes casos, não aceita relativização. Não adianta nada beber cerveja uma vez por semana, mas tomar uma caixa inteira, todo sábado. Ou tomar vinho todos os dias, mas em uma taça de 300 ml, por exemplo. No caso da bebida destilada, as consequências podem ser mais graves, porque elas acabam de fato ‘anestesiando’ toda a mucosa bucal, a faringe e a entrada do esôfago.
Por vezes, se escuta um cantor ou locutor dizendo que antes de cantar ou entrar no ar costuma tomar uma dose pra ‘aquecer a garganta’. Uma grande besteira, na opinião do Dr. Pletsch. “Na verdade ele está anestesiando todo o trato fonatório, e esse indivíduo acaba abusando, porque está de fato anestesiado e na hora não vai sentir desconforto. Porém, no dia seguinte começa a sentir aquele pigarro, dores na hora de falar, rouquidão, tudo isso em virtude da bebida para esse ‘aquecimento alcoólico’ que não deve ser feito jamais”.
Uma dica essencial do fonoaudiólogo é sempre beber água enquanto consome bebida alcoólica, seja fermentada ou destilada. “Mesmo nas fermentadas, que tem menor teor alcoólico, precisamos ter o hábito de beber água junto, porque a bebida alcoólica faz o ressecamento da mucosa e a água hidrata, melhorando toda a condição do sistema metabólico do nosso organismo.
Alimentação e sono
Aproximadamente 30% dos pacientes com disfonia e problemas de voz têm o refluxo gastro esofágico como um dos causadores, segundo o Dr. Pletsch. “O refluxo é algo que realmente nos preocupa bastante. Além das comidas gordurosas, derivados do leite, do chocolate são grandes causadores dessa condição, principalmente quando ingeridos em excesso e à noite”.
“Sempre digo: come-se de tudo, porém de forma moderada”, pondera. Para o especialista comer tarde da noite é um dos hábitos a serem evitados. “Não jante 10 horas da noite. Jante lá pelas 7, 8 horas e lá pelas 10 ou 11 horas tome um chá ou coma uma fruta para ter um sono mais tranquilo”, aconselha.
A qualidade do sono também interfere . O ideal é dormir em média de 5 a 8 horas por noite, a depender do sistema metabólico da pessoa. Afinal, quando dormimos bem, acordamos mais dispostos. O que não acontece com quem ronca, por exemplo. Quem diz que ronca ‘só quando está muito cansado’ geralmente nem percebe, mas acorda cansado no dia seguinte por conta da apneia respiratória noturna.
Resumo das dicas:
- Cigarro e qualquer dispositivo que produza fumaça a ser tragada devem ser abolidos da rotina;
- Bebidas alcoólicas só não prejudicam se consumidas com moderação, e sempre acompanhadas de água;
- Jantar no máximo 20h. Após este horário, só consumir alimentos leves;
- Dormir de 5 a 8 horas por noite;
- Manter-se hidratado com água pura e na temperatura ambiente;
- Controlar a hidratação pela cor da urina. Se estiver transparente, é sinal de boa hidratação.
- Espuma branca no canto da boca e tosse seca são sinais negativos;
- Na hora de consumir bebidas ou alimentos gelados, mantê-los na boca durante alguns segundos nos primeiros goles ou mordidas e colheradas para evitar choque térmico;
- Usar o diafragma para aumentar o tom de voz ou gritar gol, no caso dos narradores. Técnica simples que melhora a potência e reduz o desgaste físico;
- Postura ergonomicamente correta, seja sentado ou de pé, viabiliza o uso do diafragma na hora de modular a voz;
- Uso de máscara exige cuidado ainda maior com sincronia entre respiração e articulação de frases, abra mais a boca para falar e não ter a voz abafada.
Fonte: AERP