O desembargador Ricardo José Roesler assume hoje, às 17h, a presidência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Em entrevista ao ND, Roesler reafirma que vai trabalhar por uma gestão moderna que mantenha o Judiciário catarinense entre os mais eficazes do país. O presidente ressalta que o foco de sua gestão será o diálogo republicano com os demais poderes e instituições.
Natural de São Bento do Sul, Roesler começou a carreira como juiz substituto em 25 de maio de 1987. Atuou nas comarcas de Joinville, Barra Velha, Sombrio, Jaraguá do Sul e novamente Joinville, onde permaneceu por 14 anos, de 1993 a 2007. Em novembro de 2007 começou a atuar como juiz de direito de 2º grau. Assumiu como desembargador em junho de 2012. Foi eleito presidente do TRE/SC (Tribunal Regional Eleitoral) em dezembro de 2017. Por último, integrava a 3ª Câmara de Direito Público do TJSC.
Confira a entrevista:
Como o senhor se sente em assumir, após mais de 30 anos dedicados à Justiça, o mais alto posto da magistratura no Estado?
Inicialmente tenho a agradecer a confiança que os eminentes pares, os desembargadores deste tribunal, depositaram na minha pessoa e estou extremamente gratificado, honrado e com muita motivação para cumprir a minha missão de gestão desse importante Tribunal de Justiça. É uma honra servir a essa causa.
Quando em campanha à presidência do tribunal, o senhor apresentou três eixos que seriam os guias de sua gestão. Informação, integração e inovação ainda serão os norteadores de seu trabalho ou houve algum ajuste nos planos?
Esse era um plano de gestão, nós agora temos o plano estratégico, que vai detalhar todos os meandros desse plano de gestão. Informação é por que nenhuma administração de qualquer entidade, seja pública ou qualquer empresa privada, ela pode prescindir a comunicação, da informação. Não há gestão sem comunicação. Então é preciso aperfeiçoar a comunicação interna e a externa para podermos direcionar melhor os nossos entendimentos e também as nossas decisões. A integração é justamente esse diálogo que nós temos que ter internamente, o endomarketing, com os servidores, os prestadores de serviço, os usuários do sistema e também com o Ministério Público, os advogados e o público externo, que é a sociedade. Então é melhorar, aperfeiçoar cada vez mais essa integração para mostrar o que nós fazemos e melhorar a nossa atividade fim que é a entrega da prestação jurisdicional, que é a solução dos conflitos. E essa integração é feita com muito diálogo, o diálogo republicano com todas as instituições. E, por último, a inovação que não significa só tecnologia, mas também evolução.
Quais são os projetos que o senhor vai implantar para efetivar os eixos de sua gestão?
Para estruturar todos esses três eixos haverá de ter muito diálogo com o primeiro grau, com os juízes que estão lá nas suas comarcas, nós vamos fazer visitas frequentes. Diálogo com os servidores, porque nós precisamos resgatar do servidor, do juiz aquele sentimento de orgulho de pertencer ao Poder Judiciário catarinense. Essa é uma proposta da minha gestão também, resgatar o sentimento de pertencimento. Quero melhorar os projetos e métodos dos setores de trabalho aqui dentro e as condições de saúde aqui dentro (do TJ). Será um diálogo aberto com os magistrados para entender como podemos melhorar as condições de saúde que estão deficitárias em razão principalmente das tecnologias que estão sendo aplicadas. Além disso, pretendo estruturar em Santa Catarina os Juizados Especiais, que são aquelas antigas ‘causas de menor complexidade’, de menor potencial ofensivo. Vamos fazer estudos de cenários para melhorar a mediação, a arbitragem, a composição de litígios para evitar que esses litígios desaguem no Judiciário. Hoje se judicializa tudo, então precisamos reverter isso para que haja mais diálogo, mais mediação e arbitragem. Uma inovação que eu quero enfatizar na área tecnológica é a criação do Laboratório de Informação, o Labju. Queremos implantar a inteligência artificial dentro dos nossos programas digitais de tramitação de processos. Quero fazer convênios com as universidades e com as instituições que trabalham com a tecnologia da informação para poder propiciar esse novo ambiente aqui dentro. Criar startups no Judiciário para melhorar nossa atividade fim, que é resolver os conflitos e dar uma decisão lá na ponta. A sociedade quer uma solução rápida, pronta e eficaz. Nós temos uma taxa de congestionamento grande nos processos, vamos enfrentar essa taxa com base nessas inovações tecnológicas.
Na sua anterior atuação como gestor, como foi sua experiência com a aplicação desses eixos?
Eu tive uma experiência de gestão pública no Tribunal Regional Eleitoral, onde tive a honra de presidir uma eleição importante e difícil como foram as eleições de 2018 e lá eu tive a oportunidade de aplicar alguns desses princípios. É claro que aqui é tudo superlativo, nós estamos falando no Poder Judiciário estadual que é composto por cerca de 12 a 13 mil servidores, entre concursados e terceirizados, quase 510 juízes, 94 desembargadores, estamos falando de administrar 3,5 milhões de processos, que estão em tramitação no Estado de Santa Catarina, ou seja, mal comparando com uma empresa, hoje seria a maior empresa de Santa Catarina, que mais emprega, que mais presta serviço. E a nossa matéria prima é a informação, nós lidamos com informação o tempo todo. Informação que nos é dada pelo ajuizamento dos processos, informação que é repassada pelas partes, pelo Ministério Público, pelos advogados, informação que o juiz presta e a sentença, a decisão, não deixa de ser também informação ao público.
Qual é o grande desafio? É integrar essa informação, essa prestação jurisdicional no menor tempo possível e com efetividade, ou seja, com certeza de que será cumprida?
Vamos trabalhar internamente para fortalecer essas estruturas de gestão e de governança para poder entregar e continuar sendo um tribunal de vanguarda no país. Dentro da estrutura judiciária do país, nós somos o segundo tribunal de porte médio que mais julga processos.
O senhor mencionou seu trabalho no TRE durante as eleições de 2018, quando houve muitos problemas relacionados à comunicação. O senhor acredita que os órgãos da Justiça estão mais preparados para combater as chamadas fake news nas eleições deste ano?
Sim, estamos mais preparados, pois temos a experiência vivida nas últimas eleições. Mas é evidente que isso não vai terminar. O que nós temos é que controlar e minimizar os efeitos para que não haja prejuízos aos atacados (vamos dizer assim) e às vítimas e àqueles que estão sendo mal informados. Porque as redes sociais são utilizadas para desinformação muitas vezes, claro que existem exceções, mas essa desinformação desconstrói e desconstruindo em termos de eleição ela pode destruir uma carreira, pode destruir uma candidatura, pode derreter uma gestão e então o Judiciário tem que estar preparado para isso. Existem mecanismos que foram aperfeiçoados lá no Tribunal Regional Eleitoral e no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para minimizar esses efeitos.
Já que estamos falando de eleições, como o senhor vê o atual cenário político e econômico do país?
Nós passamos por momentos de muita divisão no país, de muita autocrítica também e sobretudo de muita mudança. Vejo positivamente porque nós crescemos com isso, para mais ou para menos, nós crescemos. Nós temos que enfrentar. São fases que têm que ser enfrentadas, mas vejo também com muito otimismo. Preocupação e otimismo porque essas mudanças normalmente nos fazem pensar e repensar a busca de um caminho mais tranquilo, de um país mais estruturado, de um país mais forte economicamente e eu vejo o Judiciário como um poder regulador que tende a distensionar essas distensões causadas na política e o poder regular ele é o fio condutor da estabilização social. Então, eu vejo o Judiciário atuando nesse momento, embora alguns exageros aqui acolá, mas bem estruturado. A verdade é que as nossas instituições estão fortes, elas continuam fortes, se não fosse essa fortaleza das instituições o país já teria ruído há muito tempo. Elas que mantêm esse estado de ânimo e essa democracia. É um país continental, rico, que tem muito o que crescer ainda.
Como será o diálogo do Judiciário com os poderes Executivo e Legislativo?
Ele já iniciou antes mesmo da posse. Eu os procurei, estou propondo reuniões periódicas não só com os dois poderes, mas sobretudo com o Ministério Público e com a Ordem dos Advogados do Brasil, que são parceiros indispensáveis na administração da Justiça. Então reuniões periódicas, formação de grupos, troca de informações, claro, um diálogo republicano, porque a pluralidade de ideias é da democracia. O que foi feito aqui que tiver influência lá, e ao contrário, é preciso conversar antes, e é isso que estou propondo. O diálogo republicano é aquele que você respeita a autonomia financeira e administrativa dos outros poderes. Assim como o Judiciário só vai interferir quando houver alguma quebra da democracia ou da legalidade, os outros poderes não deverão interferir no Judiciário para que não haja uma quebra do funcionamento da administração.
Fonte: NDmais